O empreendedorismo cabe tanto no ensino superior como no médio e neste merecem atenção especial os cursos com conteúdo profissionalizante
ESPAÇO ABERTO
Roberto Macedo e Wilson Victorio Rodrigues
O segundo signatário deste artigo, recém-nomeado para o Conselho Estadual de Educação de São Paulo, coordena o grupo de educadores MetaRed X, mantido pelo Universia Santander, um braço educacional dessa instituição financeira que em duas décadas já investiu cerca de € 2,2 bilhões em projetos de educação, com mais de 1 milhão de bolsas de estudo concedidas a estudantes de vários países, entre as quais 150 mil no Brasil. O objetivo é fomentar o empreendedorismo no ensino superior.
Em maio do corrente do ano, o Universia Santander realizou em Valência, na Espanha, um encontro internacional de reitores – abordado em artigo que escrevemos neste espaço em 18/5/2023 (Lições de um grande evento sobre educação) –, em que as áreas de inovação e empreendedorismo foram amplamente exploradas, já que a atual tendência entre os jovens é a predileção por carreiras independentes, com jornadas flexíveis, total ou parcialmente remotas. Essa tendência é estimulada pela revolução digital, com destaque para a inteligência artificial, que tende a reduzir a demanda de mão de obra convencional.
Outro aspecto é que a internet abriu um grande espaço para empreendedores, uma vez que várias atividades nela desenvolvidas exigem pouco capital. Acrescente-se que um levantamento publicado em 23/6/2021 pelo portal G1, da Globo, mostrou que 24% dos jovens brasileiros das classes A, B e C com até 30 anos já são empreendedores e 60% querem ter um negócio próprio.
Assim, o MetaRed X promoveu neste mês, na Cidade do México, mais um encontro internacional de dirigentes educacionais, tendo como pauta planos de apoio ao empreendedorismo no ensino superior. No Brasil, segundo pesquisa recente da Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (Abmes), apenas 50% das instituições desse nível de ensino têm núcleos de empreendedorismo. Só 32,9% responderam existir incubadoras ou startups originadas nesses núcleos. Entre as que não tinham, 42% indicaram a ausência de infraestrutura adequada como a principal causa.
Outra pesquisa da Abmes concluiu que 76% dos estudantes universitários se encaixam em ao menos uma das três condições prévias para o empreendedorismo, categorizadas em três verbos: ser, fazer e sonhar. No entanto, somente 32% acreditam que suas escolas oferecem conteúdos capazes de desenvolvê-los neste caminho. Tal cenário, extremamente preocupante, revela a necessidade de as instituições de ensino repensarem seu real papel na vida dos estudantes, pois o curso superior deve ter como uma de suas missões importantes a de preparar os universitários para o trabalho, no qual o empreendedorismo pode exercer um papel muito relevante em termos de criatividade, motivação e resultados. Para acesso às pesquisas citadas, sugerimos solicitá-las em abmes.org.br/contato.
Já no ensino médio, a evasão é agravada porque os estudantes mais pobres precisam sustentar-se e sustentar sua família, buscando trabalho. Em geral, nas escolas públicas o ensino profissionalizante ainda não se viabilizou, e mesmo que isso ocorra talvez sejam necessárias bolsas para evitar a opção precoce dos alunos pelo mercado de trabalho. A reforma do ensino médio, anunciada pelo governo federal em 2017, contempla o chamado Itinerário de Formação Técnica e Profissional (IFTP), mas uma dificuldade até aqui não resolvida é a frágil disponibilidade de professores e equipamentos necessários. Tudo ainda está por acontecer e passar por uma avaliação de resultados. Tal formação também deveria incluir o empreendedorismo, para dar aos alunos melhores condições de sucesso na sua experiência profissional. O empreendedorismo também pode ser visto como um ingrediente das metodologias de ensino que pregam um maior protagonismo dos estudantes no processo educacional.
Vale lembrar que o Brasil tem baixa participação de cursos profissionalizantes no ensino médio, se comparado a outros países, em particular os desenvolvidos, onde vemos a maior participação desses cursos como um dos ingredientes do seu desenvolvimento.
O êxito do ensino médio reformulado depende, em grande parte, da percepção do seguinte cenário: o Censo da Educação Superior, divulgado no início deste mês, dá conta de que 3 em cada 4 brasileiros entre 18 e 24 anos não têm acesso ao ensino superior, resultando, portanto, num oceano de jovens que, sem diploma universitário, precisam estar minimamente preparados para os desafios da vida contemporânea. Logo, o ensino médio tem, também, a missão de desenvolver competências profissionais ainda na fase da adolescência, pois muitos já precisam delas.
Os dois níveis de educação citados só cumprirão seus papéis se contarem com uma ampla presença do empreendedorismo e do ensino profissionalizante no cotidiano escolar dos jovens brasileiros.
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SÃO, RESPECTIVAMENTE, ECONOMISTA (UFMG, USP E HARVARD), CONSULTOR ECONÔMICO E DE ENSINO SUPERIOR E DIRETOR ACADÊMICO DA FACULDADE DO COMÉRCIO DE SÃO PAULO (FAC-SP); E DIRETOR-GERAL DA FAC-SP E VICE-PRESIDENTE DA ASSOCIAÇÃO COMERCIAL DE SÃO PAULO